26 de junho de 2007

Dulce Pontes | O coração tem três portas

Dulce Pontes
O coração tem três portas
Ondeia, 2007

Pleno de carga emocional e vocal, Dulce Pontes apresenta-nos o seu último trabalho discográfico “O coração tem três portas”, passados 4 anos sobre o seu encontro com Enio Morricone.

Enraizando-se na sonoridade tradicional portuguesa, esta reconhecida cantora a nível internacional afirma a sua faceta mais fadista, homenageando figuras tão importantes do imaginário do Fado, tais como Fernando Maurício, Amália Rodrigues e Hermínia Silva. No entanto, apesar de nos iniciar nos primeiros temas com uma interpretação mais tradicionalista, como que invocando tempos antigos, gradualmente vamos entrando num novo conceito musical sobre o Fado, muito próprio e característico de Pontes, que assume o papel de produtora, responsável pelos arranjos, pianista, compositora e directora musical deste novo disco duplo: o primeiro gravado ao vivo em tour mundial, e o segundo explorando a envolvencia acústica da Igreja de Sta Maria em Óbidos e do Convento de Cristo em Tomar (Portugal). E como se fosse pouco, somos ainda convidados a ver um DVD com imagens do concerto em Istambul, bem como uma entrevista e o making-off do CD2.

Longe do tipicismo dos bairros históricos de Lisboa, podemos ouvir a preocupação em criar novos ambientes sonoros e em inovar na estética tradicional, através de arranjos musicais mais complexos e completos, consolidando a madurez e a potencia vocal de Dulce Pontes, que não se cinge somente em recuperar a expressão do Fado, mas igualmente do Folclore lusitano em geral. De facto, o lirismo, o barroquismo ou a simplicidade conjugam-se alternadamente não só a nível musical, como também a nível instrumental, seja pelo trinar despido da guitarra portuguesa, pelo embalo do violoncelo e da harpa, ou pelo despertar da gaita e da percussão, entre outras presenças.

Não é um disco de nostalgia nem de resignação, mas antes uma declaração de vida contagiante, na qual a emoção perpassa por cada som e silêncio, e onde as portas são-nos abertas para fazer-nos comungar dos sentimentos que nos são transmitidos. É uma entrega artística e espiritual sem reservas, onde a indiferença não tem sentido.

© Sara Louraço Vidal, 2007

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